Julia Fregonese, primeira estagiária do Atelier de Conteúdo, chegou um mês antes de eu entregar o combinado no terceiro contrato da minha empresa: um estudo da cultura do Grupo Trigo, dono de marcas como Spoleto e Koni. Julia estava no segundo ano da faculdade de jornalismo e me cativou com o interesse e a vontade de aprender que transbordavam de seus olhos. Anotava suas tarefas em post-its e não deixava passar nada. Minha parte no compromisso era ensinar-lhe tudo o que pudesse sobre o trabalho – não só para ela se desenvolver no Atelier, mas para descobrir do que gosta, o que faz melhor, o que a realiza enquanto pessoa. Sempre foi isso que tive em mente e falei em voz alta, torcendo para que essas descobertas a mantivessem ali, onde ela se tornava cada vez mais relevante.
Por sete meses, eu havia conduzido sozinha esse primeiro trabalho com o Grupo Trigo (Marcela ainda não era sócia, mas sim uma parceira fundamental, que trabalhava em projetos específicos havia poucos meses). Agora, perto de entregar o resultado de algo que eu havia desenhado, enquanto o Atelier crescia, eu precisava de ajuda.
Quando se escolhe o caminho de formar os profissionais, contratando-os ainda nos primeiros anos da faculdade, é preciso estar disposta a ensinar. Quem me disse isso foi Teresa Campos Salles, consultora de RH que nos acompanha desde o primeiro processo seletivo até hoje. Como tudo na vida é uma questão de expectativa, já comecei preparada para trabalhar mais no início e, só depois, colher os frutos de ter gente bem formada para dividir a respeitabilidade.
Naquele primeiro mês da Julia, no entanto, me vi desafiada a acelerar o processo.
Julia me ajudaria a tabular dezenas de entrevistas exploratórias (dissertativas, longas e profundas) em categorias que criaríamos durante o trabalho, para representar a realidade. O objetivo era chegar a um retrato fiel e sem julgamento da cultura praticada na companhia que estudávamos. Mas Julia não sabia nem o significado de “cultura corporativa”. Por onde começar?
Por tudo ao mesmo tempo. Um livro sobre o assunto para estudar o conceito, todas as reportagens sobre o tema que achamos na internet (algumas até escritas por mim, quando trabalhava na “Época Negócios”) e conversas regadas a cafezinhos para explicar tudo o que eu sabia – vulgo “transferência de conhecimento”.
Então, lá fomos nós para dentro de uma sala de reunião, com flipchart e planilhas de Excel. Passamos vários dias úteis e um fim de semana quase inteiro na missão. Falei para a Julia escolher a refeição que quisesse e pedimos comida japonesa. Prometi que esse clima emergencial seria exceção, e não regra (promessa que tenho cumprido até hoje). E nos divertimos muito.
Deu tudo certo. Entregamos o trabalho, Julia aprendeu em um mês o que talvez levasse anos e o que mais me empolga: nossa equipe não parou de crescer.
Outro dia, um cliente supercrítico e exigente fez questão de que a Julia participasse do trabalho que nos contratou para fazer. Disse que ela o fez refletir e organizar as ideias muito além do trivial. Ouvir isso me trouxe uma das melhores sensações da vida. Me enche de orgulho saber que o Atelier ajudou a construir o caminho de alguém talentosa e dedicada como a Julia; e de admiração, por ver se revelar uma pessoa única, com um olhar singular construído a partir da própria coragem, experiências, mergulhos, desafios, perspectivas.
Durante esses quase cinco anos de convivência, agradeço a sorte de a Julia ter sido nossa primeira estagiária. Porque ela me deixou otimista em relação ao futuro, às novas gerações do Atelier. É o melhor exemplo que eu poderia desejar para quem veio depois. Reforçou a convicção de que o melhor jeito de aprender é ensinar e me mostrou que, de fato, uma boa orientação forma pessoas com potencial para superar quem veio antes.
Seguimos contratando jovens para construir conosco o Atelier. Eu vivo falando para eles o quanto torço para que sua realização coincida com as oportunidades que a nossa empresa tem para oferecer. Desejo que todos fiquem, mas sei, também por experiência, que algumas vezes os caminhos bifurcam. E tudo bem. Porque um dos aspectos mais gratificantes da vida empreendedora é ajudar a despertar o potencial de outras pessoas para que possam ir – e nos levar – além do script.
Ariane Abdallah é jornalista, autora do livro “De um gole só – a história da Ambev e a criação da maior cervejaria do mundo”, co-organizadora do “Fora da Curva 3 – unicórnios e start-ups de sucesso” e fundadora do Atelier de Conteúdo, empresa especializada na produção de livros, artigos e estudos de cultura organizacional. Praticante de ashtanga vinyasa yoga, considera o autoconhecimento a base do empreendedorismo.
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Fonte: forbes.com.br//