Ramal de metrô com quase 15 km de extensão e capacidade para mais de 300 mil passageiros foi cancelado pelo ex-governador João Doria há três anos, que prometeu um corredor de ônibus que até hoje não saiu do papel
Este site tem mantido vivo um assunto incômodo para a atual gestão estadual, o cancelamento injustificado da Linha 18-Bronze do Metrô, fruto de uma PPP assinada com a concessionária VEM ABC ainda no governo de Geraldo Alckmin, hoje no PSB.
Há três anos o então governador João Doria (PSDB) anunciou com pompa que o ramal de monotrilho seria substituído por um corredor de ônibus, o famigerado BRT-ABC, “uma opção de menor custo, de menor tempo, de mais eficiência e de menos manutenção”, segundo disse o tucano na época.
A lembrança sobre esse fatídico dia 5 de julho de 2019 é importante para que a sociedade entenda como decisões de cunho político podem prejudicar a todos. A promessa, uma das tantas do ex-governador, hoje afastado compulsoriamente da vida política ao ver suas ambições eleitorais podadas, mostra como projetos sérios são manipulados por interesses pouco republicanos.
A população do ABC Paulista foi privada de um transporte rápido, limpo e seguro e que foi uma das promessas de Doria durante a campanha eleitoral de 2018, para se conformar com mais um corredor de ônibus lento (com viagens 50% mais demoradas) e que, pasmém, até hoje não saiu do papel.
Ensaios sobre início de obras do BRT não faltaram até aqui e a promessa mais recente é que as intervenções comecem em agosto, mas num trecho menor do projeto. Ainda assim, o sucessor de Doria, Rodrigo Garcia, teima em dizer que o BRT será aberto em 2023.
O que sim poderia estar pronto no ano que vem seria justamente a Linha 18-Bronze. Como o site mostrou há exato um ano, o cronograma da obra previa um tempo de implantação de cerca de quatro anos e meio. Ou seja, se Doria tivesse usado o palanque de julho de 2019 para dar a ordem de serviço para a concessionária VEM ABC, os moradores da região do ABC estariam hoje testemunhando vias quase prontas e parte dos trens possivelmente entregues no pátio de manutenção, cuja conclusão poderia ocorrer até o final de 2022.
Repetindo o que explicamos em 2021, embora obras desse gênero sofram diversos atrasos, a chance de a Linha 18 não cumprir seus prazos seria pequena. A prova disso está na Linha 6-Laranja, que é construída numa mesma modelagem de Parceria Público-Privada. Em 21 meses de obras, a Acciona, responsável pelo projeto, já avançou em todas as frentes de trabalho e poderia estar até mais adiantada não fosse o acidente com as tuneladoras em fevereiro.
Mesmo assim, em sete meses, a empresa já se prepara para retomar as escavações e manteve a previsão de inauguração em 2025.
Precedente perigoso às licitações
Sobre o monotrilho, modal que é massacrado pela mídia por falta absoluta de conhecimento – além, é claro, de lobistas de outros modais -, basta lembrar a célere implantação da estação Jardim Colonial, da Linha 15-Prata, entregue em apenas dois anos.
Há outros exemplos que reforçam a assertividade da Linha 18 como a rápida fabricação do primeiro trem de monotrilho da Linha 17-Ouro pela BYD SkyRail. Apesar de todo embate jurídico, a fabricante chinesa surpreendeu ao mostrar a composição número um pronta na China no começo do ano. Nada impediria que ela não fizesse o mesmo para a VEM ABC, como substituta da falida Scomi, empresa que também deveria ter sido a fornecedora dos monotrilhos da Linha 17.
Em meio a esse lamentável quadro que, como não deixamos de lembrar, tratou-se do maior retrocesso em mobilidade urbana de São Paulo, o projeto do BRT-ABC segue sendo analisado pelo Tribunal de Justiça de São Paulo e pelo Tribunal de Contas do Estado.
O pacote de R$ 22,6 bilhões concedido à Metra, empresa que procurou Doria para demovê-lo da ideia da Linha 18 logo no início de seu mandato, inclui suspeitas de ilegalidades ao estender um contrato por mais 25 anos, incluindo serviços que não mantém qualquer relação com o chamado objeto original, a operação do Corredor ABD.
É uma pena que tanto o TJ-SP quanto o TCE estejam demorando tanto para decidir sobre um assunto tão importante e que pode dar margem à interpretações perigosas sobre concessões. Imagina-se que uma decisão favorável ao estado pode criar pretextos para que grupos privados assumam cada vez mais projetos sem qualquer relação com seus contratos iniciais, apenas apresentando propostas consideradas “interessantes”. Seria o fim das licitações e da concorrência pública.
Além disso, a VEM ABC cobra da gestão estadual uma indenização pela rescisão unilateral do contrato de PPP, no qual se manteve fiel desde 2014, à espera de que o parceiro público desse início às desapropriações. Mesmo não cumprindo com suas obrigações contratuais, o governo ainda tenta vender barato sua irresponsabilidade. O assunto está sendo analisado pela Câmara Brasil-Canadá e pode ter um desfecho até o final deste ano.
A um passo de ter o Metrô
A ironia desse cenário é que os habitantes do ABC estariam muito perto de utilizar a Linha 18-Bronze já que a operação assistida tinha previsão de ocorrer quatro anos após o início das obras. Hipoteticamente, a estreia poderia ser marcada para agosto de 2023, na simulação feita pelo site e mostrada no infográfico da página.
Com viagens de apenas 26 minutos entre o centro de São Bernardo do Campo e a estação Tamanduateí (Linha 2-Verde), o passageiro chegaria rapidamente a vários outros pontos atendidos pela malha metroferroviária. E o mais importante: pagando apenas uma tarifa em todo o percurso, algo que o governo ainda não garantiu no caso do BRT.
Em vez de mais de 300 mil pessoas utilizando o monotrilho, o corredor de ônibus deverá transportar no máximo pouco mais de 100 mil passageiros. Quando, só a Providência pode dizer.
Fonte: Metro CPTM