Inspirado no clássico de Cervantes, espetáculo do grupo Bota Fulô mistura teatro popular, canções autorais e crítica social em uma jornada de resistência poética
“E se eu falasse para vocês que o cavaleiro mais corajoso de todos é, na verdade, uma palhaça?” Essa provocação abre A Cavaleira, espetáculo que estreia neste sábado (3), às 16h, no Teatro Cacilda Becker, na Zona Oeste de São Paulo. Livremente inspirado no clássico Dom Quixote, o espetáculo reimagina a figura do cavaleiro andante a partir do olhar sensível de dois palhaços que perdem tudo — lar, ofício e espaço — quando uma grande empresa compra o terreno do antigo circo onde atuavam. A temporada segue até 18 de maio, com sessões sempre aos sábados e domingos, no mesmo horário.
Sob direção de Vinícius Silveira, a montagem acompanha os personagens Palafita e Massapê, vividos pelos artistas Bruna Alves e Jackson Gleizer, em uma jornada para resgatar a memória e o espírito do circo engolido pelo “progresso” corporativo. Com lirismo e humor, os dois embarcam numa travessia marcada pelo improviso, pela imaginação e por um desejo coletivo de resistência.

“Nesse espetáculo, trazemos luz à dura realidade do lúdico circense sendo engolido pelos engessados ambientes de trabalho, que limitam a capacidade criativa das pessoas”, explica Bruna Alves. A narrativa é costurada pelo narrador-músico João Barros, que conduz o enredo com instrumentos diversos, como violão, chocalhos, caron e apitos, conferindo ritmo e profundidade poética à cena. “A sonoridade do espetáculo é 100% autoral. Cada acorde e batida está a serviço da dramaturgia, trazendo vida ao corpo e às canções dos personagens”, conta o músico.
A conexão com a obra de Miguel de Cervantes surge quando Palafita encontra, entre os destroços do picadeiro, um exemplar do livro Dom Quixote de La Mancha. Inspirada pelo espírito desbravador do cavaleiro espanhol, ela convence Massapê a embarcar em uma cruzada para recuperar o espaço do circo A bordo de um triciclo, batizado carinhosamente de Rocinante, a dupla avança em busca de um mundo onde ainda seja possível rir, cantar e criar.

A música tem papel central na encenação. Ao longo do espetáculo, o público é convidado a participar das canções, que são conduzidas por Palafita ao som da sanfona. “A música aqui não é apenas trilha. É encontro, é afeto, é memória. A plateia se torna parte da história quando canta com a gente”, afirma Jackson Gleizer.
“A narrativa traz ao público a mensagem de que o circo pode estar em qualquer lugar. Basta ter imaginação, coragem e vontade de plantar o novo. É isso que a Cavaleira representa: uma travessia poética em tempos de destruição”, conclui Bruna Alves.
Sobre o grupo Bota Fulô
O grupo foi criado em 2020, a partir da inquietação dos artistas Bruna Alves e Jackson Gleizer. Movidos pelo desejo de explorar caminhos do teatro narrativo e popular, do encantamento dos bonecos, da poesia da mímica corporal dramática e da alegria da palhaçaria, o grupo tem plantado histórias e saberes, compartilhando através de espetáculos teatrais, contação de histórias e oficinas. Seus espetáculos, “Evolução dos Bichos”, “A Cavaleira”, e ‘’Ziraldo e Suas Histórias’’, tem passado por grandes festivais, Sesc e equipamentos públicos.